Gritos na tela
Associação formada por jovens há quase três anos alavanca produção cinematográfica no município do interior
Formada em torno do trabalho do tefeense Orange Cavalcante da Silva, a Associação Fogo Consumidor já produziu vários curtas e até um longa, o suspense “Gritos na selva” (Divulgação)
Tefé não chega a ter uma sala comercial de cinema para oferecer a seus moradores, mas no município a 523 quilômetros de Manaus se faz cinema, e um cinema que já atravessou as fronteiras do Amazonas e até do Brasil. O fenômeno atende pelo nome de Fogo Consumidor Filmes, associação cinematográfica surgida da reunião de jovens em torno do trabalho feito pelo cineasta Orange Cavalcante da Silva na localidade desde o final de 2010. O grupo já produziu sete curtas-metragens, além de um média e do longa “Gritos na selva”, concluído no início deste ano.
O acervo da Fogo Consumidor impressiona, considerando que a associação conta com pouco ou nenhum apoio, e fazer filmes não é barato – envolve muitas pessoas, equipamento caro e gastos inúmeros. O segredo está no uso de equipamentos mais baratos e baixos orçamentos, completados com “vaquinhas” e camaradagem. “São trabalhos com baixíssimos orçamentos, feitos apenas com uma câmera e um microfone, muitas vezes o da própria câmera. Toda a equipe se ajudou: alguém trazia a farinha, outro o peixe, um integrante tinha um motorzinho para o transporte”, conta Orange.
Produção econômica
“Gritos na selva” é exemplo dessa “produção de guerrilha”: foi filmado com recursos próprios, apenas com uma câmera digital Canon EOS t3i e um microfone direcional. Da pré-produção às filmagens, o projeto tomou três meses. “Filmávamos somente aos domingos, já que a maioria dos atores estudavam e trabalhavam de segunda a sábado”, explica Orange. A pós-produção levou mais dois meses e foi feita na ilha de edição de um amigo na Argentina.
As filmagens do longa aconteceram no porto de Tefé e na mata. Além dos atores, o filme tem uma notável participação da população ribeirinha no elenco. “Muitas dessas pessoas encontrávamos durante a rodagem, e as convidamos a participar”, recorda o cineasta. (Veja um teaser do longa.)
Terror na mata
Além da produção parcimoniosa, “Gritos na selva” chama atenção pelo estilo: o longa narra uma história de suspense, com perseguições na mata, conspirações, delírio e mortes sangrentas. Na trama, um grupo de estudantes entra na selva em busca de um amigo, e lá presencia um assassinato cometido por moradores da região. Mais tarde – há spoilers a partir daqui –, eles descobrem que o assassinato era na verdade um ritual de cura, e o pior, que foram vítimas de uma armadilha.
Orange conta que a inspiração para o roteiro, que ele escreveu há três anos, tem raízes na sua infância na comunidade de Nogueira. “Sempre chegavam pessoas de outras partes do Brasil e até de fora. Alguns eram pesquisadores e nos tratavam como se fôssemos pessoas ignorantes e primitivas, e geralmente os homens não tinham respeito com as moças da comunidade”, relembra o cineasta. “Tomei um pouco dessa experiência para desenvolver a história”.
Paixão pelo cinema
O gênero de suspense marca outras produções da Fogo Consumidor Filmes, entre elas o primeiro curta, “Meneruá”, lançado em 2010 e eleito no mesmo ano Melhor Curta do 1º Festival de Cinema de Paraíso, no Tocantins.
A aventura cinematográfica de Orange e dos jovens da associação teve início quando Orange, de volta da Argentina, onde concluía o curso de Cinema, começou a produzir em Tefé um longa como projeto final de faculdade. O trabalho atraiu a atenção dos moradores em geral, mas principalmente de adolescentes, que ficaram seduzidos pela ideia de atuar à frente ou atrás de uma câmera.
Os jovens integrantes da Fogo Consumidor recebem capacitação na área audiovisual por meio do projeto “Cinema e identidade”. As oficinas para jovens de 15 a 25 anos, explica Orange, “têm como objetivo a construção da identidade cultural do Amazonas por meio do cinema”. Há pouco tempo, a associação recebeu a boa notícia de que o projeto receberá financiamento da Secretaria de Estado de Cultura (SEC).
Iluminando vidas
Mais que um filme pronto, para Orange é a transformação que o audiovisual vem promovendo na vida dos jovens da Fogo Consumidor o resultado mais importante do trabalho da associação.
“Esse processo ajudou muitos jovens em estado de vulnerabilidade. Nao sei se algum dia vamos chegar a uma sala de cinema com um filme, mas com certeza vamos mudar a vida de muitas pessoas por meio da inclusão social com cada filme realizado”, declara o cineasta. “Isso é mais gratificante, é uma coisa que nao tem preço”.
Visual realista
A maquiagem e os efeitos especiais se destacam em “Gritos na selva”. Orange conta que o sangue falso utilizado nas filmagens, bastante realista, foi feito com mel e corante vermelho para bolo; quando o orçamento apertou, a receita mudou para açaí com limão. “Ficou muito parecido, mas o problema era colocar na boca dos atores, já que ficava muito ácido”, diz. Outro truque da equipe do longa foi usar água, terra preta e barro para criar hematomas artificiais.
fonte: http://acritica.uol.com.br/
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